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Guia da gamificação no ensino superior

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Gamificação é uma adaptação do termo em língua portuguesa para gamification. Basicamente, se refere a técnicas utilizadas em jogos para aumentar a motivação das pessoas envolvidas em determinada atividade. Na educação, é considerada uma metodologia ativa que favorece o dinamismo e o engajamento durante o processo de ensino e aprendizagem.

O termo se popularizou após a palestra TED da escritora e game designer Jane McGonigal. Após estudar o jogo on-line World of Warcraft, ela se questionou: “(games como esses) dão aos jogadores os meios para salvarem mundos e incentivos para aprenderem os hábitos de heróis. E se pudéssemos utilizar este poder que os jogadores têm para resolver problemas do mundo real?”.

Para além do mundo virtual, a gamificação pode ser aplicada sem qualquer tecnologia envolvida, visto que os princípios de recompensa, elemento surpresa e colaboração, que são características marcantes desse tipo de metodologia, podem facilmente ser transportados para o dia a dia da sala de aula tradicional.

Como a gamificação funciona?

A ideia é simples: utilizar sistemas presentes nos jogos, como a superação de desafios em troca de recompensas na sala de aula. É possível realizar isso organizando gincanas, quizzes, atividades físicas e muito mais.

Também existem ferramentas criadas especificamente para auxiliar na implementação desse tipo de metodologia, como o Kahoot e o Socrative, os quais propõem questões sobre os conteúdos estudados criando um ranking ao final.

É importante incentivar a competição saudável, para que a metodologia não se torne angustiante para os estudantes. Conforme explicam professores da Universidade Estadual do Ceará (Uece) em artigo sobre o uso da gamificação no ensino médico, “apesar de o processo competitivo estar intrinsecamente ligado aos jogos, ele não se resume apenas a isso, uma vez que a criação de um espaço colaborativo, divertido e capaz de garantir a aprendizagem é de vital importância para a eficácia do método”.

Características dos jogos (que podem ser adaptadas ao ensino)

  • Transformar notas em conquistas: que tal utilizar medalhas, carimbos ou distintivos na avaliação de trabalhos e provas? Conhecidos como badges nos jogos, estes símbolos podem representar cada conquista do estudante durante o semestre. O professor pode organizar as avaliações como se fossem “missões”, em que cada etapa cumprida recebe uma qualificação diferente. As conquistas devem coexistir com as notas tradicionais, mas são apresentadas como uma forma mais motivadora de estudar.
  • Incentivo à colaboração: muitos games dependem do trabalho em equipe e, em sala de aula, isso vai muito além dos exercícios em grupo. As trocas podem acontecer fora do ambiente físico da faculdade, com alunos de outras classes ou mesmo de outras universidades. Dentro dos limites da instituição, os alunos podem trabalhar em projetos com estudantes de outros cursos, conferindo à formação dos alunos diversidade de conhecimentos e os estimulando a buscar outros saberes.
  • O elemento surpresa: utilizar-se desse recurso pode ajudar a manter todos atentos ao que está acontecendo em sala de aula. O que o professor irá escolher como surpresa depende do assunto abordado. Quando o tema está diretamente ligado ao mercado de trabalho, por exemplo, uma conversa com um convidado especial pode ser uma boa tática. Fazer um quiz com informações transmitidas durante todo o período e utilizar pequenas recompensas também pode dar mais dinâmica às aulas.
  • Valorizar as competências: o desafio é estimular os estudantes a usar o que pesquisaram para fazer sinapses e construir o pensamento crítico. É preciso ter isso em mente quando for lançar uma tarefa. Os alunos devem adquirir mais conhecimento e capacidades, assim como os personagens dos games precisam ganhar mais pontos para aumentar sua força e capacidade de sobrevivência. Portanto, lance desafios em que os estudantes vão usar a informação para obter conhecimento. Uma tarefa simples de pesquisa pode se tornar mais ampla quando equipes diferentes se desafiam em um jogo de perguntas e respostas, por exemplo.

No caso dos professores da Uece, a ideia foi realizar uma gincana em grupos sobre neurologia. O objetivo dos alunos era acertar o diagnóstico de pacientes hipotéticos.

Caso nenhum grupo obtivesse sucesso, (ou se houvesse empate) ganharia o que atingisse a maior pontuação, obtida pelo acerto das perguntas que surgiam durante a fase de exposição dos exames complementares. Nessa etapa, a cada exame apresentado às equipes, elas deveriam, em um minuto, chegar a um consenso sobre a resposta correta em uma questão de múltipla escolha que poderia envolver conteúdos de Anatomia, Clínica, Fisiologia, Patologia Neurológica e Semiologia.

A gamificação pode potencializar a aprendizagem. Crédito: Canva.

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Por que investir na gamificação?

Após a gincana, os professores da Uece aplicaram um questionário que buscava o feedback dos estudantes sobre a atividade. A grande maioria considerou “que o ambiente propicia um espaço colaborativo para a troca de informações com estudantes mais experientes (veteranos), fomentando, também, o raciocínio crítico e clínico”. Também foi possível perceber um grande fortalecimento do trabalho em equipe.

Uma revisão bibliográfica feita por pesquisadores colombianos e publicada na Revista Ingenierías Universidad de Medellín demonstrou quais são as áreas que mais exploram o formato.

Áreas que mais utilizam a gamificação

Confira as áreas que mais utilizam a gamificação de maneira satisfatória em diferentes países, como Estados Unidos, Dinamarca e Espanha, são:

  • Engenharia e Arquitetura;
  • Administração e Economia;
  • Ciências da natureza;
  • Saúde;
  • Artes e Humanidades.

Impactos positivos da gamificação

Entre os resultados positivos da gamificação apresentados nos estudos analisados, estão:

  • A sua atuação como elemento motivador da aprendizagem, permitindo romper barreiras geográficas pela facilidade trazida pela tecnologia;
  • Maior engajamento em atividades, incluindo tarefas bônus;
  • Envolvimento e entusiasmo com o conteúdo;
  • Desenvolvimento de soft skills necessárias para o trabalho em grupo em ambiente profissional.

Como gamificar sem tecnologia?

Usar a lógica dos jogos de tabuleiro pode ser uma alternativa. Crédito: Pixabay.

Embora a gamificação seja normalmente associada ao uso de tecnologias, é possível implementar essa metodologia sem a necessidade de muitos recursos. Principalmente, se for considerada a realidade do Brasil onde 71% da população acima de 16 anos não possui acesso à internet diariamente, segundo estudo realizado pelo Instituto Locomotiva e pela consultoria PwC.

Algumas alternativas possíveis são o uso de jogos de tabuleiro, gincanas, quizzes interativos e RPGs (jogos em que os jogadores assumem o papel de personagens e constroem narrativas colaborativas).

Para a organização de atividades desse tipo, a Associação Beneficente dos Professores Públicos Ativos e Inativos do Estado do Rio de Janeiro (Appai) sugere em sua revista algumas etapas.

Veja as seis etapas sem a necessidade de muitos recursos:

  1. Definição de resultados: pense qual é o objetivo da aula, o que os estudantes devem aprender ou quais competências precisam ser adquiridas com o jogo?
  2. Escolha de um tema;
  3. Criação da estrutura do jogo: quais serão os desafios? O jogo será em equipes ou individual? Quais recompensas serão obtidas pelos participantes ao cumprirem as tarefas? Quais serão as etapas?
  4. Projete as atividades: estabeleça um planejamento de quais serão as atividades que envolvem os conteúdos da disciplina e como serão oferecidos os feedbacks para os participantes;
  5. Monte equipes (se houver);
  6. Coloque o jogo em prática.

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