Ensino Básico

Educação financeira nas escolas: o desafio de ensinar sobre dinheiro no Brasil

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O brasileiro anda pensando muito em dinheiro, talvez porque não tenha muito. Em 2022, a cada 100 famílias brasileiras, 78 estavam endividadas. O patamar é o mais elevado da série histórica da Peic, com início em 2010. Entre 2020 e 2022, a proporção de famílias endividadas passou de 66,5% para 77,9%, uma alta de 11,4 pontos percentuais..

Aprender a gastar menos nunca foi tão necessário. Mas como ensinar sobre inflação, IPCA e investimentos em um país onde mais de 50% da população adulta tem algum tipo de dificuldade financeira? Para especialistas, a solução é oferecer educação financeira nas escolas.

Ensinar sobre educação financeira nas escolas é um dos melhores caminhos para melhorar a relação do brasileiro com o dinheiro. Crédito: Marcos Santos/USP Imagens.

Ensinar sobre educação financeira nas escolas é um dos melhores caminhos para melhorar a relação do brasileiro com o dinheiro. Crédito: Marcos Santos/USP Imagens.

Educação financeira na BNCC

Em 2020, o Ministério da Educação (MEC) tornou obrigatório o ensino de educação financeira nas escolas. Desde então, as instituições de ensino devem atender às novas diretrizes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).

A decisão do MEC, no entanto, não transforma o letramento financeiro em um componente curricular a ser estudado, mas sim em um dos temas a serem desenvolvidos dentro da disciplina de Matemática.

De acordo com a BNCC, o ensino fundamental deve oferecer o estudo de conceitos básicos de economia e finanças. Além de temas como taxas de juros, inflação, aplicações financeiras, rentabilidade, investimentos e impostos. Já os alunos do ensino médio aprendem sobre temas mais complexos, como o sistema monetário nacional e mundial.

Nas escolas de tempo integral, a educação financeira também está disponível no componente “eletivas”. Ou seja, ofertada dentro de uma disciplina optativa.

Leia mais: Mentalidades matemáticas: como tornar a disciplina mais acessível e próxima dos alunos

Mas levar instrução financeira para as escolas envolve uma série de desafios. Eles vão desde a formação de professores, passando pela oferta de material didático adequado e também incluem a garantia de tempo para que os professores se dediquem ao preparo das aulas.

Devido a pandemia, o que era difícil ficou ainda pior. Em abril passado, a Associação de Educação Financeira do Brasil (AEF-Brasil) encerrou as atividades. A AEF-Brasil havia sido convocada pelo MEC para disponibilizar materiais e cursos para preparar os professores e, com isso, viabilizar a implementação da educação financeira nas escolas.

Além disso, a associação era responsável por executar a Estratégia Nacional de Educação Financeira (Enef), instituída em 2010 com o objetivo de promover ações de ensino financeiro no Brasil.

Leia mais: O que os dados do PISA 2018 dizem sobre a educação no Brasil

Enquanto a educação financeira não é implementada de forma concreta nas escolas, projetos ajudam a ensinar os estudantes a lidar com o dinheiro. Crédito: MEC.

Enquanto a educação financeira não é implementada de forma concreta nas escolas, projetos ajudam a ensinar os estudantes a lidar com o dinheiro. Crédito: MEC.

O que tem sido feito

A situação melhora um pouco quando se olha para os projetos (governamentais e sociais) que existem para atenuar o problema.

O Banco Central começou um programa para incentivar o desenvolvimento de competências financeiras por parte dos estudantes. O Aprender Valor, que está em fase de testes, deve ser implementado em todo o país no segundo semestre do ano. A iniciativa estava sendo desenvolvida no Ceará, Minas Gerais, Paraná, Mato Grosso do Sul, Distrito Federal e Pará.

Os projetos têm duração de cinco a dez aulas e podem ser aplicados tanto a distância quanto presencialmente. De acordo com o Banco Central, todas as equipes pedagógicas das escolas e técnicos das secretarias de Educação terão acesso a formação específica sobre finanças.

“Com esse passo muito esperado, abrimos a possibilidade de atingir 22 milhões de estudantes do ensino fundamental de escolas públicas”, afirma o diretor de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta, do Banco Central, Mauricio Moura. A ideia é preparar o aluno para lidar melhor com o dinheiro no dia a dia.

O Instituto Brasil Solidário (IBS) tem um projeto com o mesmo objetivo. Criador de jogos de tabuleiros que ensinam educação financeira, durante a pandemia o Instituto desenvolveu versões virtuais de jogos que ensinam economia doméstica aos alunos.

O projeto de educação financeira do IBS é oferecido a mais de 650 educadores de 84 cidades. “O acesso a um material dinâmico e de qualidade ainda é escasso para a maior parte das escolas, especialmente as públicas”, disse Luis Salvatore, presidente do IBS, ao jornal Folha de São Paulo.

Alinhado às diretrizes da BNCC, o programa também capacita os professores com aulas sobre empreendedorismo, cidadania e sustentabilidade.

Desigualdade

As avaliações mostram que o Brasil tem muito a avançar. No último relatório do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), o país ficou em 17° lugar em um ranking que mede a competência financeira de 20 países.

Mas a dificuldade não é privilégio do país. De acordo com o relatório, existe uma disparidade profunda em todos os países analisados: estudantes com condições socioeconômicas melhores apresentaram ter mais conhecimento sobre finanças pessoais.

O levantamento mostra, ainda, que a escola não é considerada a principal fonte de informação sobre educação financeira. À semelhança de outros países, 90% dos adolescentes brasileiros aprendem sobre dinheiro em casa. Na lista que avalia a exposição dos alunos ao assunto nas escolas o Brasil está em 13°.

Cassia D’Aquino, educadora financeira com especialização em crianças, disse ao jornal Valor Econômico que a falta de acesso à educação financeira nas escolas é um reflexo dos diversos problemas educacionais que existem no ensino básico brasileiro. “Não é uma questão apenas de ter o assunto na escola, mas de ter uma boa escola”, comentou.

Leia mais: Aprendizagem pode retroceder até 4 anos sem aulas presenciais, diz FGV

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2 Comments

  1. Nossa, sensacional! Muito obrigado!

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