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Os desafios de Jair Bolsonaro para a educação superior

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Encontrar soluções para a gestão financeira das universidades públicas e ampliar o acesso de entrantes ao ensino superior estão entre os principais desafios do presidente eleito Jair Bolsonaro para educação em 2019.

Embora Bolsonaro não tenha apresentado propostas claras para a área em seu plano de governo, entre as medidas que se especula estão a cobrança de mensalidade nas instituições públicas, a exemplo da Austrália, e a reformulação no sistema de financiamento estudantil.

A discussão sobre o setor já começou mal. Depois de revelar a intenção de transferir a gestão do ensino superior do Ministério da Educação (MEC), que ficará sob a tutela de Ricardo Vélez Rodríguez, para o da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), Bolsonaro recuou. Será mesmo o MEC o responsável por regular as 2.448 instituições de ensino superior (IES) que atendem quase 8,3 milhões de alunos, de acordo com o último Censo da Educação Superior.

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Orçamento das instituições públicas

Mesmo abocanhando a maior parte do orçamento do MEC, as instituições públicas (em sua maioria) convivem com restrições de caixa. Segundo levantamento do portal G1, suprimidas as despesas vinculadas (aquelas obrigatórias, como o pagamento de salários e aposentadorias) o repasse do MEC em 2017 às instituições foi o menor em sete anos, totalizando R$ 6,1 bilhões, contra R$ 7,3 bilhões do ano anterior.

Esse é o montante que as instituições têm disponível para custeio e ampliação, por exemplo. O levantamento também mostrou que 90% das universidades tiveram queda real de orçamento nos últimos cinco anos.

Bolsonaro não é claro a respeito de como pretende tratar do tema. Mas em suas manifestações o presidente eleito tem reiterado que priorizará o ensino básico e que os problemas no ensino superior se limitam a gestão, não ao volume de recursos.

Leia mais: Menos da metade dos alunos da rede pública mira diploma universitário

Na opinião da socióloga Maria Helena Guimarães de Castro, é preciso rever a autonomia financeira das universidades públicas. Um dos problemas, segundo ela, é a falta de mecanismos para que as instituições captem recursos por conta própria.

“O problema não são as IES, mas a legislação que precisa mudar. A autonomia financeira é importante, mas tem que ter uma comissão que estude como fazer, porque as federais são diferenciadas entre si”, explica Castro, ex-presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e ex-secretária-executiva do MEC.

Já a proposta de cobrar mensalidade nas instituições públicas, com base no poder aquisitivo do aluno, divide especialistas. Enquanto alguns consideram que seria uma ajuda bem-vinda ao caixa das instituições, outros avaliam que, além de representar pouco para o orçamento, a medida vai contra os princípios e conceitos da universidade pública e gratuita no Brasil.

“Mesmo em instituições muito caras, como o MIT, as mensalidades representam só 10% do orçamento” ponderou o reitor da Universidade de São Paulo (USP), Marcelo Knobel, em seminário promovido pelo jornal Folha de S. Paulo.

Novos alunos

A inclusão de novos estudantes no ensino superior é outro dilema. Pelo Plano Nacional de Educação (PNE), a taxa bruta de matrículas no ensino superior (número total de estudantes matriculados, independentemente da idade, dividido pela população de 18 a 24 anos) precisa chegar a 50% até 2024. Atualmente, está em 34,6%.

Ferramentas como o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e a Lei de Cotas têm impacto no indicador. Porém, ambas já foram questionadas pelo presidente eleito, que promete reavaliá-las a partir de 2019.

O Fies enfrenta uma grave dificuldade no que se refere à inadimplência, que chega a 41% dos contratos em fase de amortização. Segundo o MEC, o débito total do programa já ultrapassa os R$ 10 bilhões. Nos últimos dois anos, o governo federal ajustou o programa, mas ainda não houve sinalização de melhoria.

Leia mais: Faculdades equilibram descontos para não perder margem e alunos

A Associação Brasileira das Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes) pretende propor ao novo governo alterações que garantam mais fôlego ao Fies. A entidade alega que em 2018 foram fechados apenas 81 mil contratos, 26% do total ofertado – sendo 2018 o pior ano da história do programa.

A principal proposta seria a retomada do financiamento integral do valor do curso, atualmente limitado em 50%. As instituições estariam dispostas a conceder descontos de até 30% no valor das mensalidades. “Estamos com proposta estudada para futuro governo e, apesar de céticos, estamos otimistas”, afirmou o presidente da Abmes, Janguiê Diniz.

Os representantes da IES privadas também pretendem sugerir a inclusão da EAD ao Fies. Querem aproveitar a intenção, reiterada diversas vezes por Jair Bolsonaro, de apostar na educação a distância.

Formação prática

Durante a campanha eleitoral, Jair Bolsonaro demonstrou contrariedade com o que considera preocupação excessiva dos estudantes com a formação superior. Segundo ele, o país precisa de mais profissionais de nível técnico, de “formação prática”. Daí sua intenção de priorizar políticas de ensino profissionalizante.

Para o professor Claudio de Moura e Castro, autor de vários livros na área da educação, o ensino superior brasileiro, majoritariamente o privado, poderia, sim, entregar uma formação mais prática.

“Nos países industrializados, têm mais graduados no que equivale ao nosso tecnólogo do que na graduação de quatro anos. Temos um problema de desequilíbrio”, pondera.

Confira a série Tendências 2019

Foto em destaque: Jair Bolsonaro em entrevista coletiva, em Brasília. Créditos: José Cruz/Agência Brasil.

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4 Comments

  1. […] Os desafios de Jair Bolsonaro para a educação superior […]

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  4. Reportagem muito interessante!

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