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Vivemos tempos em que é possível obter uma resposta antes mesmo de formular a pergunta.
A inteligência artificial (IA) promete eficiência, velocidade e previsibilidade — e cumpre. Mas a educação, se quiser continuar sendo relevante, precisa mirar outra direção: aquela em que a dúvida não é uma falha, mas uma ferramenta.
Se as máquinas respondem com precisão, talvez reste ao humano justamente aquilo que a máquina não pode entregar: o inacabado, o improviso, a hesitação criativa.
A educação não deve competir com a inteligência artificial. Ela deve cuidar do que a IA não alcança. E isso começa com uma pergunta.
O crescimento da inteligência artificial está moldando não apenas a maneira como acessamos informação, mas também como pensamos — e o que deixamos de pensar.
Modelos preditivos se alimentam de padrões estatísticos: observam o passado para prever o comportamento futuro. Quanto mais interagimos com essas ferramentas, mais nos tornamos versões estatisticamente coerentes de nós mesmos.
Essa eficiência, porém, cobra um preço.
Ao eliminar desvios, a IA reduz o inesperado. E o inesperado é, muitas vezes, o que move a criação, a investigação e o aprendizado.
Nesse cenário, educar não pode significar apenas treinar para operar sistemas. Educar é introduzir ruído onde há excesso de ordem. É criar espaço para o pensamento que não se encaixa — ainda.
Durante muito tempo, o conhecimento foi uma moeda social. Saber mais era ter mais poder.
Hoje, a informação está disponível em larga escala. Saber, sozinho, já não é suficiente. O diferencial está na capacidade de interpretar, tensionar, conectar.
Saber perguntar — e saber sustentar uma boa pergunta em aberto — se tornou uma habilidade crítica.
Essa não é uma ideia nova. Paulo Freire dizia que “ensinar exige curiosidade”. Edgar Morin propôs “educar para a incerteza”. Ambos compreendiam que o conhecimento mais transformador não é o que confirma, mas o que perturba.
A pergunta, nesse sentido, não é uma etapa anterior à resposta. É um movimento intelectual em si.
Em vez de buscar respostas rápidas, talvez seja hora de proteger o tempo da pergunta. A escola que se propõe a formar sujeitos críticos não pode se limitar a validar o que já é sabível.
Ela precisa criar ambientes em que o erro não seja punição, mas pista. Onde a complexidade não seja um obstáculo, mas um método.
É nesse ponto que metodologias como a aprendizagem baseada em projetos, a sala de aula invertida e o ensino por investigação ganham relevância. Elas deslocam o foco do conteúdo para o processo; do acerto para a elaboração; da resposta certa para a pergunta que ainda não foi feita.
Há uma tentação crescente de usar a inteligência artificial como ponto de partida para qualquer tarefa. Redações, planos de aula, ideias de projetos — tudo começa com um prompt.
Mas terceirizar a ignição criativa compromete a experiência da descoberta. A IA pode ampliar repertórios, sugerir possibilidades, organizar argumentos. Mas ela não deve substituir o processo cognitivo que antecede a criação: o desejo de entender, a dúvida insistente, o incômodo produtivo.
A questão não é “usar ou não usar IA”, mas “como e com que propósito?”.
A inteligência artificial não é inimiga da educação. O problema está em usá-la para acelerar o que deveria ser desacelerado: o pensamento.
A educação não pode se resumir à transmissão de conteúdo ou ao treinamento para um mundo automatizado.
Ela precisa oferecer aquilo que nenhum sistema, por mais avançado, consegue replicar: a capacidade humana de criar sentido em meio à incerteza.
Isso significa formar sujeitos capazes de fazer perguntas que ainda não têm resposta. Ou, mais profundamente, capazes de sustentar o desconforto de não sabê-la.
Essa talvez seja a principal competência do século 21: lidar com o que não está resolvido.
Como transformar salas de aula em espaços de investigação genuína? Eis algumas pistas:
• Trocar aulas expositivas por vivências dialógicas;
• Estimular perguntas que cruzem saberes, realidades e afetos;
• Avaliar não apenas o que o aluno responde, mas o que ele ousa perguntar;
• Premiar a imaginação mais do que a reprodução.
Encantamento não é ornamento. É consequência de um ambiente em que perguntas são levadas a sério.
Perguntar, hoje, é um gesto subversivo. Porque recusa a pressa, o automatismo e a ilusão de que tudo já está resolvido.
Num tempo em que o pensamento é continuamente empurrado para a eficiência, a educação que se propõe a provocar dúvidas em vez de eliminar incertezas age como contrafluxo.
Talvez a inovação mais radical deste século seja essa: ensinar alguém a sustentar a dúvida — antes que ela seja dissolvida por mais uma resposta automática.
Por Thuinie Daros
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